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O que é o tal do “orgasmo cerebral”?

Thiago Sievers Head de Parcerias

Maria está bombando. Mas Maria não é brasileira. E não canta sertanejo. Maria também não está no BBB. E não lidera nenhuma manifestação.

Maria é sexy. Para alguns. Para outros ela é apenas a dona de uma voz absolutamente ridícula. E com ideias cretinas.

O que Maria faz? Vídeos. Quem bomba hoje em dia sem fazer vídeos?

Seu canal no YouTube, o “Gentle Whispering” (algo como “Sussurros Gentis”), tem 180 mil inscritos e 50 milhões de views. E olha que a duração de suas produções fogem da cartilha dos virais – 20, 30, 40 minutos.

Mas, e aí, o que Maria faz?

Bem, Maria sussurra. Bem baixinho. Fala ao pé de seu ouvido virtual (aka fone). Acaricia seu cabelo (aka… sei lá). Massageia suas têmporas (sei lá também). Além de manipular objetos, dos mais diversos, na frente da câmera (mas nenhum vibrador, que fique claro).

O seu objetivo é simples: proporcionar aos seus espectadores o “orgasmo cerebral”.

“Orgasmo cerebral” é o apelido que alguns dão à resposta fisiológica conhecida oficialmente como Resposta Sensória Meridiana Autônoma – ou ASMR, em inglês. Mas esse termo foi “catalogada” recentemente.

De acordo com o Vice, o grupo Society of Sensationalists criou um página no Yahoo! em 2008 para entender o que significavam essas sensações, na época desconhecidas. Todos sentiam as mesmas coisas, mas ninguém sabia do que se tratava.

Então as pessoas começaram a procurar na internet por “weird head fellings” ou “head tingles” (“sensações estranhas na cabeça” ou “formigamento na cabeça”) e criaram diversos fóruns para discutir sobre o assunto.

E assim foi até 2010, quando um moço chamado Andrew MacMuiris criou o blog “The Unnamed Felling” (“A Sensação Sem Nome”). Ali as pessoas procuravam respostas sobre o que era aquilo, como acontecia, de onde vinha e se outras pessoas também tinham as mesmas sensações.

Até que apareceu uma moça chamada Jennifer Allen que fundou o Instituto de Pesquisa do ASMR e registrou o fenômeno como Resposta Sensória Meridiana Autônoma.

Em conversa com o Vice, Jenn explicou que “autônoma” se refere à natureza individual das respostas, que não estão sob o nosso controle; “resposta” e “sensória” são auto-explicativas; e “meridiana” é um termo mais educado do que “orgasmo”. “Tente recolher dinheiro para um estudo intitulado ‘orgasmos cerebal’”, disse a moça. E até que o nome oficial soa respeitável.

Segundo relatos, a ASMR trata-se de uma sensação prazerosa de formigamento em partes do corpo, que normalmente começa pelo couro cabeludo, vai descendo pela espinha e pode se espalhar pelo resto do corpo. Essa resposta pode ser provocada por diversos estímulos (ou gatilhos, como costumam falar por aí), sejam eles sonoros, visuais, olfativos ou mesmo cognitivos.

Não é uma resposta necessariamente sexual, pelo que eu entendi (eu acho que não sou um ASMRer). Mas, sim, está ligado à sexualidade.

No entanto, a classificação da ASMR ainda é algo controverso, uma vez que ela é ignorada como objeto de estudo da ciência por conta da dificuldade que se tem de pesquisá-la, já que é algo muito subjetivo. Logo, ninguém sabe direito do que se trata.

É engraçado como os estímulos que provocam essas sensações podem ser tão variados. É perfeitamente compreensível quando falamos que essas respostas (que vão além do formigamento – pode ser também um estado de felicidade plena, algo quase hipnótico) é originado por um sussurro sexy.

Mas pela sonoridade de uma língua estrangeira? Por receber atenção exclusiva? Por observar alguém realizar uma tarefa manual com habilidade? Para mim isso é bem estranho. Mas para quem sente não.

A ASMR vem fazendo tanto sucesso – desde que surgiu – que há diversos canais que se dedicam somente à produção de vídeos com o propósito de favorecer o “orgasmo cerebral” (esse site é voltado apenas para isso). E para atingir esse objetivo os caras (ou melhor, as minas) capricham na criatividade. Algumas publicações chegam a ser cômicas. Para quem não sente nada é realmente ridículo. Totalmente surreal.

Tem gente que se dedica bastante para fazer os vídeos, que, como falamos, chegam a durar mais de 40 minutos. Um dos gatilhos para disparar as respostas de ASMR é observar alguém muito talentoso exercer uma tarefa com maestria. Então alguns vídeos chegam a demonstrar uma preparação grande por parte de quem os faz.

Em outros casos a pessoa passa 20 minutos falando sobre qualquer coisa, qualquer bobagem, simplesmente para poder sussurrar em nossos ouvidos.

E esse é o caso de Maria.

Maria parece ignorar que existe uma tela entre eu e ela. Em um dos vídeos ela me saúda desse jeito: “Oi. É incrível finalmente te conhecer cara a cara”.

Cara a cara? Hã?

Depois ela começa a verificar meu corpo – meu corpinho, que está do lado de cá – já que a suposta proposta do vídeo é algo semelhante a uma “consultoria” de terno.

Para mim essas produções não fazem muito sentido. Mas, se não fazem muito, é porque fazem um pouco. E esse pouco tem a ver justamente com os murmuros que a moça dá quase beijando o microfone – o que seria o meu ouvido.

Nesses momentos, Maria sai da área de captação da câmera e se dirige para a parte lateral de meu rosto. Ela está ali. Ou melhor, aqui. Ela está logo aqui. Sim, eu caí em seu jogo, Maria. É possível sentir sua respiração e cada articulação de sua boca.

Arrepia. Não tem como não arrepiar. É como se alguém estivesse literalmente cafungando em seu cangote.

Mas eu não senti nenhum formigamento. Essas descrições que dizem que algo saí da cabeça e passa pela espinha… não. Nada. Muito menos um estado de felicidade, ou algo quase hipnótico.

É verdade que há outros instantes do vídeo em que me senti profundamente relaxado. Até entendo o que deve ser o tal do ASMR, mas não me considero no grupo dos que têm o “orgasmo cerebral”.

Por conta dos filmes soarem bastante estranhos – até uma perversão disfarçada – para quem não se envolve, assistir a eles pode ser algo embaraçoso. Tanto é que algumas autoras já tiveram problemas com os trolls da internet, que xingaram até a 9ª geração de suas famílias por não sentirem os fenômenos relatados.

Mas, enfim, trolls são trolls. Ainda mais na internet.

Agora, depois dessas experiências e de ler algumas impressões, sinto que o mundo se divide em dois: os AMRSers e os pobres humanos. Ou melhor, em três: os AMRSers, os pobres humanos e Maria.

E você, sente alguma coisa?