O perfume gourmand é uma das famílias olfativas mais envolventes da perfumaria moderna. Inspirado diretamente no universo da confeitaria, da gastronomia e dos sabores adocicados, ele desperta sensações ligadas ao prazer, ao conforto e à memória afetiva.
Diferente das famílias tradicionais, que buscavam referências florais, verdes ou amadeiradas, o gourmand introduziu um novo território sensorial: o do “comestível traduzido em aroma”.
Embora hoje seja amplamente difundido, o gourmand é relativamente recente na história da perfumaria. Seu surgimento marca uma mudança importante na forma como os perfumes passaram a se relacionar com emoções, desejos e até com a ideia de indulgência.
a origem do gourmand e o perfume que mudou tudo
O termo “gourmand” vem do francês e está associado a quem aprecia boa comida e sabores intensos. Na perfumaria, ele começou a ser usado para definir fragrâncias que evocam doces, sobremesas e ingredientes açucarados de forma explícita.
O nascimento oficial do gourmand aconteceu em 1992, com o lançamento do perfume Angel, de Thierry Mugler. Essa criação rompeu completamente com os padrões da época ao introduzir notas como chocolate, caramelo, algodão-doce e baunilha de forma declarada e dominante. Até então, elementos doces existiam na perfumaria, mas sempre como coadjuvantes.
Angel inaugurou uma nova linguagem olfativa. Pela primeira vez, um perfume assumia sem pudor um caráter adocicado intenso, quase gastronômico, abrindo caminho para uma nova família que rapidamente se tornaria uma das mais influentes do fim do século XX.
A composição clássica dos gourmand
Diferente de famílias como o fougère ou o chipre, o gourmand não possui um acorde rígido e fechado. Ainda assim, algumas matérias-primas tornaram-se praticamente sinônimos desse estilo e aparecem com frequência nas fórmulas. Entre os ingredientes mais comuns estão:
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Baunilha, em diferentes variações e concentrações;
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Caramelo, açúcar queimado e notas de toffee;
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Chocolate, cacau e nuances achocolatadas;
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Mel, leite e acordes cremosos;
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Amêndoa, praliné e notas de confeitaria.
Esses elementos costumam ser combinados com bases amadeiradas, resinosas ou ambaradas para evitar que o perfume se torne excessivamente enjoativo. O contraste entre doçura e profundidade é o que garante equilíbrio e sofisticação ao gourmand.
O sucesso do gourmand está profundamente ligado à sua capacidade de ativar memórias e emoções. Aromas adocicados remetem à infância, a sobremesas caseiras, a momentos de conforto e recompensa. Esse tipo de associação cria uma conexão imediata e instintiva com quem usa e com quem sente o perfume.
Ao contrário de fragrâncias mais abstratas ou formais, o gourmand é direto, envolvente e muitas vezes sedutor. Ele não sugere apenas elegância, mas prazer. Essa característica fez com que a família se tornasse especialmente popular a partir dos anos 2000, acompanhando uma mudança cultural em que o luxo passou a ser associado também à experiência sensorial e emocional.
A chegada dos gourmands masculinos
Durante muitos anos, o gourmand foi visto quase exclusivamente como um território feminino. A doçura intensa e as associações com confeitaria eram consideradas incompatíveis com a perfumaria masculina tradicional. Isso começou a mudar no final dos anos 1990 e início dos anos 2000.
A introdução de notas como baunilha, fava tonka, mel e chocolate em perfumes masculinos ganhou força quando equilibrada com tabaco, couro, especiarias e madeiras escuras. Esse contraste criou fragrâncias mais densas, sensuais e noturnas, que ajudaram a redefinir o que se entendia como masculinidade olfativa.
Hoje, diversos perfumes masculinos consagrados exploram o gourmand de maneira elegante e bem estruturada. Alguns se tornaram verdadeiros ícones por saberem dosar doçura e intensidade com precisão. Entre os exemplos mais conhecidos estão:
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A*Men (Thierry Mugler)
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Pure Havane (Mugler)
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Stronger With You (Emporio Armani)
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Black XS (Paco Rabanne)
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Spicebomb Extreme (Viktor & Rolf)
Essas fragrâncias mostram como o gourmand masculino pode variar entre o adocicado confortável, o especiado envolvente e o denso quase licoroso.
Gourmands modernos e novas interpretações
Com o amadurecimento da família, os gourmands contemporâneos passaram a explorar novas direções. Surgiram versões mais secas, menos açucaradas, muitas vezes combinadas com notas minerais, incenso, couro ou acordes amargos.
Outra tendência forte é o gourmand amadeirado, no qual a doçura aparece de forma mais controlada, integrada à base, criando perfumes sofisticados e menos óbvios. Além disso, o crescimento da perfumaria de nicho trouxe interpretações mais ousadas, inspiradas em cafés, bebidas alcoólicas, especiarias exóticas e sobremesas regionais.
O gourmand permanece relevante porque conversa diretamente com o prazer sensorial. Ele não é apenas um perfume para cheirar bem, mas para provocar sensações. Em um mundo cada vez mais acelerado, fragrâncias que remetem a conforto, indulgência e acolhimento ganham ainda mais espaço.
Além disso, o gourmand mostrou ser extremamente adaptável. Ele pode ser jovem ou sofisticado, casual ou noturno, intenso ou sutil. Essa flexibilidade garante sua presença constante nas prateleiras e nos lançamentos das grandes marcas.


