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O Transtorno Bipolar não é qualquer simples alteração de humor

Ouvi de uma jovem a seguinte exclamação: “Minha mãe é bipolar!”. A afirmação, tão categórica quanto descompromissada, me chamou a atenção. Logo em seguida questionei-a: o que é ser uma pessoa bipolar?

Penso que esta frase, dita por uma adolescente em meu consultório, refere-se a sua mãe que, como qualquer outra mãe de um jovem em São Paulo, se vê as avessas com a oscilação entre momentos de paz e grande irritação com seu filho “aborrescente”.

Poderia afirmar com tranquilidade que a mãe em questão não é portadora desse diagnóstico, e talvez por isso eu tenha ficado ainda mais curiosa com aquelas palavras ditas por uma menina de apenas 11 anos.

Poderíamos pensar, caros leitores, que assim como a lâmina de barbear tornou-se Gilette e a esponja de aço o Bombril, “Fulano ser bipolar” talvez seja a nova nomenclatura para pessoas que (como qualquer outro ser humano da atualidade) variam de humor com grande facilidade.

Apesar da ironia implícita em uma gíria, ser ou não portador de um Transtorno de Bipolaridade é algo bastante sério e deve ser entendido com cuidado e atenção.

A doença

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O Transtorno Bipolar, ou então transtorno maníaco-depressivo, é uma doença psiquiátrica inscrita no Manual Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (DSM-IV) caracterizada por alterações de humor que se manifestam com episódios depressivos alternando-se com episódios de mania.

Para que possamos diferenciar estes episódios depressivos e maníacos, de tristezas e alegrias, cabe pontuar que são sintomas graves e bastante diferentes aos altos e baixos que todos passamos em nossas vidas.

Quando em um episódio depressivo, o paciente tem como sintoma características muito parecidas a uma depressão, descritas anteriormente em um texto aqui no El Hombre. Elas são: corriqueira sensação de sentir-se vazio e angustiado, cansaço e lentidão ao fazer as atividades antes comuns ao dia a dia, perda de interesse por atividades antes vitais, redução do desejo sexual, problemas em concentrar-se, irritação e inquietude, insônia e pensamentos suicidas.

Já em um episódio maníaco, o bipolar sente-se eufórico e extremamente agitado, não conseguindo concentrar-se, pois pula de uma ideia para outra, com dificuldades para formar linhas de raciocínio. Fala bastante, tornando-se de fácil distração. Devido à grande excitação, põe-se em risco, pois pensa ser inalcançável e poderoso.

Muitos pacientes praticam esportes radicais e investem em negócios de alto risco por não medirem consequências. Fazem compras e gastam com facilidade quantidades importantes de dinheiro, além de manterem inúmeras relações sexuais, muitas vezes sem o uso de preservativo.

A fim de ilustrar pensemos que, quando em um episódio de mania, o paciente pensa ser um super herói, capaz de tudo, sem que haja consequências ou perigos.

Apesar de comuns em um adulto com Transtorno Bipolar quatro ou cinco episódios de mania ou depressão ao longo de um ano, muitos têm o chamado episódio misto, quando características de euforia e depressão são presentes em um mesmo episódio de humor.

Nota-se então, leitores do ELH, que as bruscas mudanças de humor presentes em um portador da bipolaridade, podem, diferentemente de uma chateação ou alegria comuns à vida, prejudicá-lo em diferentes aspectos: no âmbito profissional, pessoal, econômico, até mesmo levando-o ao suicídio.

Possíveis causas

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Sabe-se que o transtorno bipolar está associado a algumas alterações funcionais do cérebro, nas áreas de processamento de emoções, motivação e recompensas, como o caso do lobo pré-frontal e da amígdala. Outro componente envolvido é a produção de serotonina no tronco-cerebral, uma substância imprescindível para o funcionamento harmonioso do cérebro.

Diagnóstico

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É comum que o Transtorno do Humor Bipolar apareça ao final da adolescência, no início da vida adulta. Em pelo menos metade dos casos os primeiros sintomas se dão antes dos 25 anos. Porém, em não se tratando de uma ciência exata, é possível que algumas pessoas tenham seus primeiros sintomas durante a infância. Com isso, é preciso que profissionais como professores, pediatras, e psicólogos estejam atentos para que seja feito, se preciso, o diagnóstico precoce.

Este diagnóstico não é de fácil percepção, pois os sintomas muitas vezes aparecem como problemas em separado, não reconhecidos como parte de um único quadro patológico. É comum que pacientes com Transtorno Bipolar procurem por ajuda médica e psicológica quando em um episódio depressivo, achando tratar-se de uma depressão. Ou então, crianças que, agitadas em um episódio de mania, podem ser confundidas com hiperativas.

Algumas pessoas sofrem por anos antes de serem corretamente diagnosticadas e tratadas. O Transtorno Bipolar é uma doença de longa duração que deve ser manejada com cuidado ao longo da vida, sempre com acompanhamento médico, psicológico e da família.

Tratamentos

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Atualmente existem tratamentos bastante eficazes no combate ao Transtorno Bipolar, em que, em poucas semanas, é possível reverter um episódio grave de euforia ou depressão. Isso se consegue com medicamentos como neurolépticos, antipsicóticos e estabilizadores do humor, e a retirada de certas substâncias que agravam o quadro como a cafeína e a anfetamina.

O grande cuidado a ser tomado em relação ao paciente no uso de medicamentos – e que por isso deve ser acompanhado de perto por um médico – é justamente o caráter oposto dos episódios de humor.

Em um episódio depressivo deve-se estar atento ao uso de medicamentos antidepressivos que, embora eficazes, podem precipitar uma virada indesejável para a euforia ou acelerar a frequência das crises. O contrário também deve ser observado no uso de ansiolíticos em episódios de mania e que podem evoluir para um quadro depressivo.

Para além do uso de medicamentos, precauções e tratamentos complementares devem ser usados na busca por benefício aos portadores de Transtorno Bipolar.  É importante que rotinas sejam impostas e adotadas aos jovens, como a fixação de horário para dormir e acordar, e a restrição de substâncias como o álcool, drogas e cafeína.

A psicoterapia pode ser utilizada não somente para auxílio ao paciente no trato com sua doença, mas também como apoio às famílias que devem se adaptar às novas rotinas.

O Transtorno Bipolar é uma doença que não tem cura, mas que, quando devidamente medicada e acompanhada, há grande melhora dos sintomas apresentados, podendo assim o paciente retomar sua vida e rotinas.