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15 horas por semana

Durante 95% da história, as pessoas trabalhavam 15 horas por semana. Será que conseguimos fazer isso de novo?

Pedro Nogueira Editor-Chefe

Nos últimos tempos, a possibilidade de reduzir a jornada de trabalho de 5 para 4 dias tem sido cada vez mais debatida. Algumas pessoas acham impossível. Outras, creem que é necessário. O fato é que ainda não existe consenso sobre o assunto. Mas um artigo recente da revista Inc jogou nova luz sobre o assunto, ao afirmar que durante 95% da história, as pessoas trabalhavam apenas 15 horas por semana. “Será que conseguimos fazer isso de novo?”, se pergunta a matéria, que traduzimos abaixo ao português, para quem tiver interesse em se aprofundar no tema.


Segunda-feira (01) foi o Dia do Trabalho, o que significa que, além dos churrascos e das escapadas de fim de verão, muitos de nós paramos um momento para refletir sobre as conquistas obtidas pela organização trabalhista. A jornada de trabalho de oito horas, condições seguras de trabalho e o fim do trabalho infantil foram resultados de lutas sindicais. Antes dessas batalhas, as coisas eram bem sombrias para o trabalhador médio, certo?

Se você voltar um ou dois séculos, a resposta é certamente sim. Durante a Revolução Industrial, os trabalhadores labutavam 14 horas por dia, seis dias por semana, às vezes em condições perigosas e sem seguro-desemprego ou Previdência Social para recorrer. Comparado a eles, somos todos um bando de preguiçosos.

Isso pode levar você a concluir que devemos ser gratos pela nossa atual jornada de trabalho de 40 horas e aceitá-la como um bom negócio pelos padrões históricos. Na verdade, não, argumenta o antropólogo e autor James Suzman em um artigo recente do “Financial Times”.

No longo e fascinante artigo, Suzman detalha suas décadas de pesquisa em sociedades de caçadores-coletores africanos e usa suas descobertas para argumentar que, se olharmos ao longo de um período muito mais amplo da história, os seres humanos modernos são estranhamente viciados em trabalho. Provavelmente seríamos mais felizes e saudáveis se trabalhássemos muito menos horas.

Historicamente falando, somos viciados em trabalho

Graças às aulas de história no ensino médio, a maioria de nós pensa no passado em termos de centenas ou, no máximo, alguns milhares de anos. Mas os seres humanos modernos existem há pelo menos 300 mil anos. E as evidências antropológicas mostram que, durante a maior parte desse tempo, nossos ancestrais levavam vidas bastante despreocupadas, relata Suzman.

“Nossos ancestrais caçadores-coletores quase certamente não suportaram as vidas atuais”, ele escreve, usando como base estudos dos Ju/’hoansi, um grupo de caçadores-coletores que vive na África Austral. “Os Ju/’hoansi foram revelados como bem alimentados, satisfeitos e com maior expectativa de vida do que as pessoas em muitas sociedades agrícolas, e por raramente terem que trabalhar mais de 15 horas por semana, tinham tempo e energia de sobra para se dedicarem ao lazer.”

Com tanto tempo livre, nossos ancestrais passavam o resto dos dias “em outras atividades com propósito, como fazer música, explorar, decorar seus corpos e socializar”, diz Suzman.

De volta ao futuro do lazer?

Isso parece bem legal. Mas o que isso tem a ver conosco?

É improvável que muitos de nós escolham abrir mão de Netflix e iPhones por cabanas, caça e mais tempo livre. Suzman argumenta que olhar para o longo período da história é importante porque revela nossa obsessão pelo trabalho árduo que surgiu em um contexto muito específico, a saber, os primeiros dias da agricultura.

Naquela época, a terra mal podia sustentar a população, e um único evento de azar, como uma seca ou uma enchente, poderia levar à fome em massa. O trabalho duro era essencial para a sobrevivência.

Mas isso não era verdade para centenas de milhares de anos antes e também não é verdade agora. Os caçadores-coletores não enfrentavam escassez extrema e, graças à tecnologia, nós também não enfrentamos. Trabalhamos muito mais do que precisamos para proporcionar uma vida decente a todos.

Por quê? Muitas pessoas inteligentes já opinaram sobre o assunto, argumentando de tudo, desde sinalização de status (ou seja, todos estão ocupados o tempo todo para provar o quão importantes são) até inércia, crescente desigualdade e simples avareza. Mas seja qual for o motivo, com mais líderes começando a defender inovações como a jornada de trabalho de quatro dias e a renda básica universal, a cultura pode estar lentamente se deslocando em direção a um modelo menos intensivo em trabalho.